quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

O ensino de produção textual com base em atividades sociais e gêneros textuais*
Désirée Motta-Roth**

O ensino de produção textual depende de um realinhamento conceitual da representação do aluno sobre o que é a escrita, para quem se escreve, com que objetivo, de que modo e sobre o quê, as atividades de produção textual propostas devem ampliar a visão do aluno.
As atividades sociais podem ser definidas como ações por meio das quais as pessoas tentam alcançar determinados objetivos. gênero textual é uma combinação entre elementos lingüísticos de diferentes naturezas que são socialmente compartilhados.
Há inúmeros aspectos constitutivos dos gêneros ou das situações e ações sociais das quais a linguagem é parte integrante. Os estudos da linguagem fazem referência ao contexto como “situação enunciativa”, ou, na definição de Bazerman, como o conjunto de “todos os fatores [...] que dão forma a um momento no qual uma pessoa se sente chamada a estabelecer trocas simbólicas”. Os PCN’s fazem referência à necessidade de o aluno ser educado no sentido de fazer a relação e a adequação que se estabelece entre texto e contexto: entre as escolhas que são postas a seu dispor pelo sistema léxico-gramatical da língua e o contexto de uso da linguagem, isto é, a situação social em que se encontra. A referência ao contexto é feita de diferentes maneiras: seja quando o documento enfatiza que o aluno deve ter “oportunidade de – individualmente, em duplas ou em grupos – participar de situações dialogadas” e “produzir um texto oral [...] de acordo com [...] o nível de formalidade exigido para a situação enunciativa” ; seja quando sugere ao professor, como trabalho em sala de aula, “desde bate-papos mais informais a propósito de uma obra literária até o julgamento da atitude de uma personagem do texto literário num debate regrado”, pois exigem dos interlocutores “um grau maior de formalidade e de consciência do texto argumentativo que estão produzindo na fala”

O foco da educação lingüística, portanto, recai sobre o ensino da interlocução. Ensinar linguagem passa a ser mais do que ensinar as estruturas da língua, pois se concentra em levar o aluno a desenvolver competências analíticas dos contextos de uso da linguagem de modo a se tornar capaz de analisar discursos. Os contextos, como situações recorrentes na sociedade, são constituídos na linguagem e pela linguagem e se estruturam como partes da cultura. Como construtos intersubjetivos da coletividade
Define gêneros como interações “retóricas típicas com base em situações recorrentes” num determinado contexto de cultura. Há aqui o pressuposto de que as pessoas reconhecem similaridades entre situações recorrentes e assim elaboram representações de ações tipificadas. Essa representação é um construto social, intersubjetivo, baseado em esquemas mentais das situações, que, por sua vez, são construídos a partir da experiência social, em termos de linguagem pertinente, eventos e participantes relevantes.
O ensino de produção textual depende de um realinhamento conceitual da representação do aluno sobre o que é a escrita, para quem se escreve, com que objetivo, de que modo e sobre o quê; e as atividades de produção textual propostas devem ampliar a visão do aluno sobre o que seja um contexto de atuação para si mesmo. Evidentemente, guardadas as diferenças entre a universidade e a escola, entendo que esses princípios são suficientemente gerais e valem para ambos os contextos acadêmicos.
O primeiro princípio é de que o entendimento do ato de escrever como uma prática social pressupõe a diferenciação entre escrever como grafar e escrever como produzir texto e construir significados sócio-compartilhados. O segundo é de que, para que a produção textual seja uma prática social, é necessário ter uma visão mais rica do ato de escrever em si: escrever não pressupõe apenas a produção do texto, mas também seu planejamento (antes), sua revisão e edição (depois) e seu subseqüente consumo pela audiência-alvo, para que autor e leitor possam atingir seus objetivos de trocas simbólicas.
Há, pelo menos, duas propostas relevantes para o ensino de produção textual na escola que se pautam por uma concepção do escrever como prática social.
A primeira Consiste na troca de impressões dos alunos sobre si mesmos.Proposta essa descrita em livros custeados pela própria comunidade. E a segunda proposta é explicitamente voltada ao contexto educacional, pois trabalha com a produção de texto no gênero acadêmico relatório de pesquisa, com o objetivo de produzir conhecimento.
Outro exemplo de atividade explora o âmbito da estética e da percepção. O ato de observar a obra de arte ou sua reprodução é desnaturalizado pela professora de Artes de modo a levar o aluno a fazer uma observação consciente, exercitando sua capacidade analítica.
A terceira atividade diz respeito à atividade física na aula de Educação Física. O professor propõe ao aluno que ele próprio (o aluno) seja o objeto de investigação. Ao fazer isso, o professor orienta a atenção do aluno para uma observação metódica.
Ao aprender os gêneros que estruturam um grupo social com uma dada cultura, o aluno aprende maneiras de participar nas ações de uma comunidade. Descobrir como fazer isso consistentemente na sala de aula parece ser o nosso desafio. A sala de aula de línguas talvez seja o lugar onde devemos analisar, criticar e/ou avaliar as várias instâncias de interação humana de culturas localizadas, nas quais a linguagem é usada para mediar práticas sociais.

Nenhum comentário: